Guia prático para empregadores: gorjeta

A Lei nº 13.419/2017, conhecida como Lei da Gorjeta, alterou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para disciplinar a cobrança, o rateio e a distribuição das gorjetas em bares, restaurantes, hotéis, motéis e estabelecimentos similares.

Mais do que regulamentar uma prática comum, a lei trouxe responsabilidades formais para empregadores e impactou diretamente a composição da remuneração dos trabalhadores. Já o Tema 234 do TST, recentemente consolidado, reforçou essa importância, ao consolidar que as gorjetas integram a remuneração, mas não servem de base de cálculo para todas as parcelas trabalhistas.

O que a lei considera como gorjeta?

A gorjeta pode se apresentar de duas formas:

Espontânea – quando o cliente entrega diretamente ao empregado, por vontade própria;

Cobrada pela empresa – quando a taxa de serviço (geralmente 10%) é lançada na nota de consumo e destinada ao rateio entre os empregados.

Em ambos os casos, a gorjeta não é receita da empresa, mas direito dos empregados.

    Regras de rateio e distribuição

    O rateio deve ser fixado por convenção ou acordo coletivo de trabalho;

    Na ausência de norma coletiva, os critérios podem ser definidos em assembleia geral dos trabalhadores;

    O empregador deve garantir transparência e registrar adequadamente os valores, evitando questionamentos futuros.

    Retenção permitida para encargos

    A lei autoriza o empregador a reter parte da gorjeta arrecadada para custear encargos sociais, previdenciários e trabalhistas:

    Empresas do Simples Nacional: até 20% de retenção;

    Demais empresas: até 33% de retenção.

    O restante deve ser integralmente distribuído aos trabalhadores.

    Obrigações formais do empregador

    A Lei da Gorjeta exige:

    Registro na CTPS e contracheque do salário fixo e da média/período de gorjetas;

    Comissão de empregados em empresas com mais de 60 trabalhadores, para fiscalizar a regularidade da cobrança e distribuição;

    Incorporação ao salário: se a gorjeta for cobrada por mais de 12 meses e depois extinta, incorpora-se ao salário a média recebida nos últimos 12 meses (salvo disposição coletiva em contrário).

    Penalidades em caso de descumprimento

    Se o empregador descumprir as regras de repasse ou controle:

    Multa diária de 1/30 da média da gorjeta por dia de atraso, limitada ao piso da categoria;

    A multa é triplicada em caso de reincidência;

    Além das multas, há o risco de condenação em reclamatórias trabalhistas por apropriação indevida.

    O Tema 234 do TST e a integração da gorjeta

    O Tribunal Superior do Trabalho, ao fixar a tese no Tema 234, decidiu que:

    As gorjetas integram a remuneração do empregado;

    Mas não servem de base para cálculo de aviso-prévio, adicional noturno, horas extras e repouso semanal remunerado (reafirmação da Súmula 354 do TST).

    Assim, a gorjeta tem reflexos em verbas como FGTS, férias e 13º salário, mas não em todas as parcelas. Isso traz segurança jurídica aos empregadores, evitando cobranças indevidas.

    Situações práticas para empregadores

    Quando o empregador não cobra gorjeta

    A cobrança é opcional; se não houver taxa de serviço, não há dever de repasse.

    Empregados recebem apenas o salário fixo.

    Atenção: se a empresa já cobrou gorjeta por mais de 12 meses e depois parar, a média dos últimos 12 meses se incorpora ao salário (salvo convenção coletiva).

    Quando o empregador não controla a gorjeta

    A lei exige controle transparente.

    A falta de registro expõe o empregador a multas, reclamações trabalhistas e presunção de apropriação indevida.

    É essencial manter planilhas, recibos e comprovantes.

    Quando não há gorjeta recebida

    Se os clientes não deixam gorjeta, nada muda: o empregador paga apenas o salário fixo.

    Não há obrigação de complementar valores em razão da ausência de gorjeta.

    Quando existem apenas gorjetas espontâneas

    Pagas diretamente pelos clientes, sem passar pelo caixa da empresa.

    Mesmo assim, integram a remuneração do empregado.

    O empregador deve:

    – Definir critérios de tratamento em convenção ou acordo coletivo (ou em assembleia dos trabalhadores, na falta deles);

    – Registrar, sempre que possível, a média de valores recebidos na CTPS;

    – Observar que, se não houver gorjeta espontânea em determinado período, o salário fixo é o único devido.

    Conclusão

    A Lei da Gorjeta e o Tema 234 do TST trazem um recado claro:

    A gorjeta é direito do trabalhador, e o empregador é responsável por garantir transparência em sua arrecadação e distribuição.

    Quando cobrada na nota, exige controle rigoroso; quando espontânea, deve ser regulada por negociação coletiva; quando inexistente, não há complementação devida.

    Cumprir a lei evita multas e litígios, fortalece a confiança da equipe e demonstra responsabilidade empresarial.

    Em síntese: gorjeta não é lucro da empresa, mas remuneração do trabalhador — e sua gestão correta é parte essencial do compliance trabalhista.

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